Crônica do Tempo.

 



O tempo passou e o que sobrou foi o apego à casa, aos objetos e ao instinto de não querer partir.

No porta-retratos, o passado distante reúne histórias e relembra dias ensolarados.

No velho apartamento, as janelas fechadas impedem a brisa dos sonhos penetrarem

e se tornam a masmorra de uma vida que já cessou.

As cenas acontecem lá fora, mas aqui dentro tudo parou.

Os passos lentos não suportam mais o corpo magro e frágil. As mãos tremulam.

Onde foi parar a beleza que um dia habitou esse rosto sem expressão?

O olhar evita meus olhos e as palavras surgem sem sentido.

Os tetos amarelados e engordurados, tão diferente de quando eu corria pelos corredores e brincava de querer ser alguém.

As paredes têm obras de arte que não dizem mais nada, apenas escutam palavras duras de alguém que um dia amei.

As boas lembranças são de quem já partiu - a saudade, o carinho - mas aqui ficou apenas a realidade de quem desconheço.

Onde estão as mãos que seguravam tão firmes os meus punhos?

Onde vive aquela guerreira que vestiu armadura contra dores e sentimentos?

Não a encontro. Sobraram apenas vícios, instintos e nada mais.

Peço desculpas por não fazer mais do que faço. Por não conseguir ser mais do que sou.

Sinto não poder chegar mais perto, secar suas feridas.

Sou apenas alguém que zela por confortar os dias que restam.

O problema são as feridas que se abrem dentro de mim e estas não têm mais cura.








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